Fabricio da Mata Corrêa
Como já se tem revelado um costume no Brasil, determinada matéria só passa a receber ou mesmo merecer a atenção do poder legislativo nacional e de certa forma da própria sociedade, depois que ela passa a contar com certo espaço nos meios de comunicação. Para se entender, basta que um assunto comece a ganhar espaço na mídia para que em seguida o legislativo já demonstre certo interesse em regular a questão.
Como já se tem revelado um costume no Brasil, determinada matéria só passa a receber ou mesmo merecer a atenção do poder legislativo nacional e de certa forma da própria sociedade, depois que ela passa a contar com certo espaço nos meios de comunicação. Para se entender, basta que um assunto comece a ganhar espaço na mídia para que em seguida o legislativo já demonstre certo interesse em regular a questão.
Assim
como muitos outros temas que se tem notícia, esse também tem se revelado como
mais um problema de ordem política, que aliado a muitos outros temas, serve
apenas para engrossar o coro das muitas manifestações que temos visto surgir no
país. Vários são os projetos que por anos estão tramitando na casa de leis e
nem por isso se tem previsão de quando serão enfim analisados.
Pelo
retrospecto, guardada as devidas proporções, a apreciação de determinada
matéria por parte do legislativo não demanda apenas interesse social, o que se
tem visto é que a análise dos projetos obedece a priori o interesse dos partidos políticos. São eles que julgam o
que será conveniente apreciar naquele momento, como foi, por exemplo, com os royalties.
De
outro lado, também influenciando na atuação do legislativo temos a mídia, visto
que quando determinado assunto fica e voga nos meios de comunicação deixando transparecer
para a sociedade a necessidade de se regular tal matéria. Agindo com o intuito
de desmontar trabalho, vê-se nessas situações uma movimentação no legislativo
no sentido de regular tal questão.
Há
matérias que até recebem, depois de todo esse movimento, a atenção do
legislativo que sinaliza no sentido de cuidar do assunto, mas basta a sociedade
esquecer do tema que novamente ele é deixado no esquecimento. E isso faz com
que determinada matéria acabe se tornando recorrente no cenário político
legislativo, pois se a necessidade de regulamentação é latente e se mesmo assim
nada é feito, sabidamente mais cedo ou mais tarde ele voltará para pauta. Exatamente
como tem sido com o tema maioridade
penal.
Resumindo,
o legislativo hoje analisa aquilo que melhor lhe convir ou então aquilo que a mídia
estabelece como prioridade. Essa atuação legislativa motivada pelo clamor
social acaba ganhando maior ênfase em matérias onde sabidamente há um grande
inconformismo social, assim como tem sido a questão da maioridade penal.
Na
verdade não podemos nem dizer que esse tema em algum momento tenha saído
completamente do campo do debate, melhor dizer que no seu curso sempre houve
momentos em que ele era visto com maior e com menor intensidade, mas o assunto
sobre a maioridade penal sempre esteve em voga, ainda mais quando atos infracionais
acabavam ganhando repercussão nacional por conta da gravidade.
Antes
de toda comoção que hoje toma conta do país, alguns eventos envolvendo a participação
de menores de 18 anos, acabaram ganhando espaço na mídia nacional, reacendendo
assim a discussão sobre o assunto. E o que se fala por discussão é o velho
discurso: é possível reduzir a idade
penal?
Tratando
especificamente do problema da idade penal, vale dizer que essa não foi a primeira
e nem será a última vez que o tema estará em debate. Na verdade, de todos os
assuntos que exercem esse tipo de influência sobre o poder legislativo, a redução
da maioridade é de fato um dos temas mais recorrentes. Contudo, certo estamos
que basta o tema esfriar que nada mais se fala nem se faz, e tudo cai novamente
o ostracismo do legislativo esperando novamente que ciclo se inicie.
Na
realidade são dois os fenômenos que provocam ressurgimento do debate. Como já
falamos, um é quando um ato infracional é cometido e acaba ganhando contornos
de mídia nacional, e outro, é quando se esta próximo de um período de eleição e alguns candidatos formam suas plataformas
políticas com promessas eleitoreiras nesse sentido. Esses são de fato os
vetores que fazem o tema ressurgir.
Em
um quadro geral sabe-se que há vários projetos que por anos tramitam no
congresso nacional, e que em comum têm o mesmo objetivo que é justamente
reduzir a maioridade penal no Brasil, e para tanto, cada um a seu modo,
estabelece uma nova idade que julga ser a mais adequada. De todos esses
projetos nenhum foi visto como sendo de possível aprovação, posto que eles não
conseguem vencer a barreira sustentada por muitos de que tal redução seria
inconstitucional.
Pois
bem, superada essa visão geral sobre o tema, importante que chamemos a atenção
para algo que a sociedade não conhece e propositadamente vem sendo mantida na
ignorância. O que não se fala no atual discurso de redução é justamente que a
responsabilidade penal no Brasil começa aos 12 (DOZE) anos de idade e não aos
18 como fazem parecer. Isso mesmo, a responsabilidade penal no Brasil tem seu
início como também início da adolescência. Por isso, para que reduzir a
maioridade penal para 16, por exemplo, se ela já é de 12?
Temos
apenas que fazer uma distinção. Há de fato duas espécies de responsabilidade
penal, aquela aplicada aos menores de 18 anos, que é a chamada responsabilidade
penal juvenil e a que é aplicada aos maiores que é explicitada tão somente por
responsabilidade penal. Agora, por serem desconhecidas, muitos acabam caindo no
erro de se dizer que a responsabilidade penal no Brasil só começa aos 18 anos.
É
preciso diferenciar o que é responsabilidade penal das consequências jurídicas
geradas a partir dela. A responsabilidade penal permite apenas que o individuo
seja responsabilizado pelos atos então praticados, agora, a intensidade dessa responsabilização,
ou seja, a pena é que será dosada pela espécie de responsabilidade, se juvenil
ou não.
Adolescentes
infratores são sim responsáveis penalmente. Ocorre que a responsabilidade juvenil
aplicada aos mesmos não permite que suas punições sejam tão intensas quanto àquelas
destinadas aos adultos. Daí já começamos a ver e a entender que o problema
então não estar em se responsabilizar os menores de 18, pois isso já existe,
mas sim, em cuidar da forma com que eles são punidos.
A
diferença primordial entre essas responsabilidades resumi-se tão somente na
forma com que as respectivas sanções são aplicadas, ou melhor, sua intensidade.
O inconformismo que tem servido de combustível para as duras críticas que são
feitas sobre esse modelo, tomam como parâmetro as disposição do Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECRIAD), lei nº 8.069
de 1990, que a bem da verdade, possui previsão de punição muito aquém das
gravidades dos atos infracionais praticados.
Por
isso que o discurso de alguns dizendo que não há punição para os menores é por
certo falacioso, pois sabemos que não é assim, mas ocorre que é isso que querem
que todos acreditem. O que ocorre é que a criminalidade juvenil evolui tanto
nos últimos anos, que acabou por se tornar tão grave quando aquela praticada por
adultos, e as punições previstas continuaram as mesmas.
Dissemos
anteriormente que há vários projetos que visam modificar a idade penal no
Brasil, sendo assim, por que nenhum
deles já conseguiu tal reforma?
Brevemente,
podemos dizer que o entrave resume-se no entrave em duas posições: i) uns defendem não ser possível tal alteração, posto que isso seria uma garantia fundamental e por certo
uma clausula pétrea, logo qualquer tentativa de alteração seria por certo inconstitucional;
ii) outros dizem não ser inconstitucional,
posto que tal critério etário não é garantia constitucional.
Importante
dizer que a idade de dezoitos anos não foi determinada originalmente pela Constituição
de 1988, mas sim pelo Código Penal de 1940, que pautado em critérios de política
criminal vistos para a época, determinou tal critério etário, que só mais tarde
fora recepcionado pelo constituinte originário.
Em
todo esse tempo, não há como negar que não só Brasil passou por inúmeras mudanças,
como o perfil do adolescente visto na década de 40 também fora muito alterado, motivado
até pelas muitas mudanças sociais. Desta forma, os mesmos critérios utilizados
em 1940, não servem aos dias atuais, posto que o perfil do adolescente infrator
da década de 40 nem se equipara ao perfil que se tem hoje.
Feito
isso, passou-se a indagar se por ter sido recepcionada, a inimputabilidade do
menor havia recebido o status de direito e garantia fundamental que, por
conseguinte seria cláusula pétrea e assim não poderia ser objeto de reforma.
Em
apertada síntese, é exatamente dessa forma que se encontra a discussão sobre o
tema no Brasil. Enquanto um grupo defende que a idade de 18 anos é sim cláusula
pétrea, outro defende exatamente o contrário, afirmando ser possível a
modificação. A conclusão que se chega
diante desse aparente quadro é que a presente discussão além de descabida também
se revela por certo infinita.
Inovando
esse cenário e surgindo como verdadeira promessa de resolução, há uma terceira corrente
que dada a coerência apresentada nos seus argumentos vem ganhado força dentre
os estudiosos no assunto, que é justamente o fato de se mudar o foco da
discussão, passando para aquilo que pode facilmente ser modificado, sem,
contudo demandar discussões sobre constitucionalidade.
O
ponto em toda essa questão que vem despertando todo o inconformismo social e
provoca na sociedade todo esse sentimento de impunidade é o fato de que um
menor infrator não fica internado por mais de três anos. Esse tempo de
internação não esta previsto na constituição, mas sim no próprio ECRIAD, que assim dispõe:
Art.
121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de
internação excederá a três anos.
Portanto,
ao invés de se perder tanto tempo com a eterna discussão sobre a
constitucionalidade ou não da redução da maioridade penal, que já vimos não levará
a lugar nenhum, altera-se o foco, ou seja, ao invés de se pretender mudar a Constituição
basta modificar o próprio ECRIAD, que
por sua vez, sendo uma lei federal, hierarquicamente inferior a Constituição, afastará
qualquer discussão sobre constitucionalidade.
Outrossim,
importante dizer que optando por essa medida, se cuidaria apenas da mudança em
uma lei, que ainda que seja federal, possui um processo de alteração bem mais
fácil do que o visto para se alterar qualquer parte da constituição, que de tão
complicado recebeu o adjetivo de rígida.
Basta
se modificar as disposições do Estatuto no que tange as penalidades dos menores
infratores, fazendo de forma com que não haja mais o limite de três anos e que
o tempo de internação seja na verdade estabelecido de acordo com a gravidade do
ato, que certamente não só a sociedade deixará de sentir o sentimento de
impunidade que hoje é latente, assim como os próprios adolescentes mudarão a
visão que têm da lei, ou seja, a percepção de serem intocáveis.
O foco deve ser outro. Atualmente, algumas pessoas têm feito parecer
que há inúmeras diferenças envolvendo o tratamento que é dispensado aos menores
infratores daqueles recebido pelos adultos, no sentido de que estariam os
menores recebendo um tratamento mais brando. Devemos dizer que na prática,
ainda que a lei diga o contrário, a única distinção que há resumi-se ao fator
tempo de internação, posto que em outros aspectos não se verifica qualquer diferença
no tratamento. Até as unidades de internação, na prática, em nada se
diferenciam dos modelos de presídios espalhados pelo país.
Sendo
assim, fica claro, portanto que o foco da discussão deve estar na forma e no quantum de punição que deve ser aplicado
aos menores. Não negamos a necessidade de haver uma reformulação nesse quadro,
pois conforme já falamos não se pode continuar tratando um adolescente infrator
que hoje participa de organizações criminosas, pratica crimes graves,
hediondos, daquele modelo visto na década de 40, que quando muito praticava uma
contravenção penal ou quando muito um crime considerado leve.
Entretanto,
ainda que reconheçamos essa necessidade, não nos cabe aqui dizer ou mesmo fazer
previsão de qual seria o tempo mais razoável a ser aplicado aos menores. Isso não
deve surgir como fruto de “achismo” e nem mesmo feito para agradar a sociedade,
mas sim deve surgir como resultado de um profundo e completo estudo de política
criminal.
O
mais importante nesse momento é que a sociedade entenda que o atual discurso que
se deve reduzir a maioridade penal, é por certo um ponto inatingível. Não podemos
mais permitir a perpetuação dessa falácia ou mesmo continuar comprando essa
idéia.
A
defesa feita por essa terceira corrente é tão lógica que beira o campo da
simplicidade, mas ocorre que mesmo assim demorou anos para ser ouvida. Isso nos
revela outro ponto que é o seguinte: será que há realmente interesse por parte
do legislativo em se resolver essa questão? Pois se resolvido esse ponto, qual
outro tema mediático virá para ocupar o seu lugar, e como ficarão as
plataformas políticas firmadas com base nesse tema? Enfim, será que existe
interesse de se mudar esse quadro? Caso exista, o caminho esta ai!
#acordabrasil
Fonte de imagem - Google