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“O Direito Penal tem cheiro, cor, raça, classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado.” (Rogério Greco – Direito Penal do Equilíbrio)

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

NOVAS SÚMULAS PENAIS DO STJ (500 A 502)




Súmula 500: a configuração do crime previsto no artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal.

A súmula vem para solidificar entendimento de que a simples presença de um menor acompanhando um adulto na hora em que este pratica uma infração penal, já é capaz de ensejar a configuração do crime do artigo 244 do ECRIAD que diz:
Art. 244-B.  Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la

A súmula permite ainda o entendimento de que pouco importa para a configuração do crime de corrupção de menor, o fato deste já ter sido “corrompido” em momento anterior e que já tenha praticado inclusive ato infracional ou mesmo já ter cumprido medida socioeducativa.

Esse entendimento decorre do fato que a corrupção pode ser vista não só pela introdução do menor no mundo do crime, como também no fato de impedir seu distanciamento de tal mundo.



Súmula 501: é cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei 6.368/76, sendo vedada a combinação de leis.

Diante da enorme confusão que se verifica na prática, onde muitos juízes acabam mesclando os dispositivos da antiga lei de drogas (6.368/76) que eram mais favoráveis, com aqueles que também são mais benéficos segundo a nova lei, qual seja, a 11.343/06.

Em resumida síntese, o que se via era que como a antiga lei possuía uma pena mínima para o crime de tráfico menor do que aquela vista na nova lei, ela acabava sendo invocada para estabelecer esse mínimo mais benéfico. Enquanto que a nova lei de benéfico possui uma causa de redução de pena (artigo 33, § 4o) que não se via na lei antiga. Desse modo, acabava que na prática os juízes misturavam os dispositivos com a escusa que isso seria mais benéfico ao acusado.

Realmente era mais benéfico, posto que o acusado acabava se beneficiando com aquilo que se tinha de mais brando nas duas leis, em relação ao crime de tráfico. 

A súmula por sua vez, passa a impedir essa combinação, mas admite de outro modo, que a  lei anterior seja aplicada em detrimento da nova e assim vice e versa, mas desde que essa aplicação seja além integral, mais benéfica.

Essa análise exigirá do magistrado uma análise mais minuciosa do caso concreto. O que se imagina que passará a ocorrer é o seguinte: acusado já reincidente ou então com mácula em seus antecedentes que não o permitirá ter a redução de pena do artigo 33, § 4o, da Lei 11.343/06, poderá ter a aplicação da lei 6.368/76, como mínimo de pena que previa o antigo artigo 12, qual seja, 03 anos; noutro quadro, caso se verifique a possibilidade dele ser beneficiado pela citada redução de pena, que pode chegar até a 2/3, será desse modo aplicada a nova lei.

Mas claro que isso não passa de uma projeção. Certo é que teremos que aguardar para ver como as sentenças doravante passarão a tratar a matéria.



Súmula 502: presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas.

A tão controvertida materialidade do crime de crime de “pirataria” parece ter sido reavivada com a presente súmula, ou pelo menos foi isso que se tentou.

O que se discutia em relação a esse crime, até por força da teoria constitucionalista do delito, é que tal crime não guardava relevância típica material capaz de justificar a atuação do direito penal. Claro, que a verificação, bem como a implementação do reconhecimento da atipicidade material era precedida de análise principiológica, daí toda sua força.

O princípio basilar do direito penal que é a adequação social, há muito tem revelado que a prática da “pirataria” deve ser combatida de outra forma que não com o direito penal, posto que tal conduta além de possuir um mínimo grau de lesão, ainda se apresenta como um fato socialmente aceito e que por consequência possui a mínima reprovabilidade.

Ao que parece a presente súmula veio para por fim nessa discussão e deixar certo que o fato possui sim tipicidade material. Mas claro que o embate vai continuar, posto que a completa ausência de tipicidade material é resultado de uma análise principiológica com viés constitucional, de forma que não é uma súmula que mudará tal verificação e tampouco diminuirá a força da teoria constitucionalista do delito.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

STJ – DECISÃO – Furto de Energia Elétrica X Pagamento do Débito




Ao julgar o Habeas Corpus nº 252802,  a quinta turma do Superior Tribunal de Justiça, decidiu pelo trancamento de ação penal onde se apurava a prática do crime de furto de energia elétrica (Art. 155, § 3º do Código Penal), uma vez que a suposta autora do delito já teria quitado seu débito com a concessionária antes do recebimento da denúncia.

Normalmente, considerando a conduta imputada à acusada, o máximo que se poderia cogitar no caso à título de benefício seria uma redução de pena pautada no arrependimento posterior. Ocorre que no caso, numa clara demonstração de aplicação da analogia in bonam partem, a maioria dos ministros decidiram pela aplicação do disposto no artigo 34 da Lei nº 9.249/95, que diz:

“Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.”

O entendimento foi para também aplicar no caso, o mesmo benefício que a Lei nº 9.249/95, conferiu àqueles que respondem por crimes de ordem tributária.
A decisão aponta para pensamento moderno em nível de direito penal, e claro, também em nível de justiça. Muito mais que punir alguém sem ter a efetiva necessidade, o que se busca de fato é a tão almejada paz social, e no caso em especial, a inteira reparação do mal praticado. 

Sabe-se que a função primordial do direito penal é a proteção dos bens jurídicos mais importantes. Sendo assim, considerando que a lei por si só não foi suficiente para reprimir a prática do ilícito, mas que por outro lado possibilitou que a vítima (concessionária) tivesse reparado todo o prejuízo suportado pelo crime, que razão haveria em punir alguém simplesmente por punir? Não é essa a função do Direito Penal!

A questão ainda demonstra um grave problema do judiciário, principalmente no trato penal, que é a insistência das jurisdições primárias em não reconhecer certos benefícios em favor dos acusados. No caso em questão, mesmo estando clara a ausência de justa causa para o seguimento do feito, ainda assim, precisou chegar até o STJ para que só assim tivesse o feito o desfecho certo. 

Se tal decisão tivesse sido tomada ainda no início do processo, certamente o Estado não teria despendido tempo e dinheiro na persecução de um fato que desde o início já se sabia o desfecho.

                    
Ementa do julgado:
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. NÃO CONHECIMENTO.
1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, buscando dar efetividade às normas previstas na Constituição Federal e na Lei 8.038/1990, passou a não mais admitir o manejo do habeas corpus originário em substituição ao recurso ordinário cabível, entendimento que deve ser adotado por este Superior Tribunal de Justiça, a fim de que seja restabelecida a organicidade da prestação jurisdicional que envolve a tutela do direito de locomoção.
2. Tratando-se de writ impetrado antes da alteração do entendimento jurisprudencial, o alegado constrangimento ilegal será enfrentado para que se analise a possibilidade de eventual concessão de habeas corpus de ofício.
FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA (ARTIGO 155, § 3º, DO CÓDIGO PENAL).
ACORDO CELEBRADO COM A CONCESSIONÁRIA. PARCELAMENTO DO VALOR CORRESPONDENTE À ENERGIA SUBTRAÍDA. ADIMPLEMENTO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ANALÓGICA DAS LEIS 9.249/1995 E 10.684/2003. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. OCORRÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
1. Embora o valor estipulado como contraprestação de serviços públicos essenciais - como a energia elétrica e a água - não seja tributo, possui ele a natureza jurídica de preço público, já que cobrado por concessionárias de serviços públicos, que se assemelham aos próprios entes públicos concedentes.
2. Se o pagamento do tributo antes do oferecimento da denúncia enseja a extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária, o mesmo entendimento deve ser adotado quando há o pagamento do preço público referente à energia elétrica ou a água subtraídas, sob pena de violação ao princípio da isonomia.
3. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para determinar o trancamento da Ação Penal n. 201221290048.
(HC 252.802/SE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 03/10/2013, DJe 17/10/2013)

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

STF DIZ NÃO AO DIREITO PENAL DE AUTOR





Com a maturidade que se espera de uma Corte que há vinte e cinco anos zela pela Constituição, julgando o RE – Nº.583.523, o STF declarou como não recepcionado o artigo 25 da Lei de Contravenções Penais (LCP), Decreto-lei nº 3.688 de 1941.
A redação do artigo 25 da LCP é a seguinte:



Art. 25. Ter alguem em seu poder, depois de condenado, por crime de furto ou roubo, ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo, gazuas, chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto, desde que não prove destinação legítima:
Pena – prisão simples, de dois meses a um ano, e multa de duzentos mil réis a dois contos de réis.

Nota-se que o aludido artigo considera como infração penal a conduta daquele, já condenado por crime contra o patrimônio ou que esteja respondendo o processo em liberdade, ou ainda, que seja tido como vadio ou mendigo, que ele ande portando materiais usualmente destinados à prática de crimes de furtos e roubos. E para essa conduta foi especificada pena de prisão simples de dois meses a um ano e multa.

Analisando o tipo mencionado, mais acertada não poderia ser a decisão da Corte, uma vez que a própria Constituição, por meio de seus dispositivos, presa por um tratamento humano e igualitário entre os iguais. Logo, punir alguém não por fazer determinado ato, mas sim por ser ou ter características diferentes dos demais é claro direito penal de autor.

Um dos maiores e mais fortes pilares da Constituição 1988 é justamente a tão conhecida e declarada Igualmente. Esta que deve nortear todo o ordenamento jurídico no que tange ao tratamento das pessoas, por isso, permitir que alguém seja punido por ser diferente, viola diretamente tal princípio. Além disso, o artigo 25 da LCP desalinha com outro dispositivo constitucional que é justamente a presunção de não culpabilidade. Sem falar é claro, que trata-se de infração penal de perigo abstrato, ou seja, sem um mínimo de lesividade.

Importante dizer que a Corte foi unânime na decisão de não recepção. Devendo ser ressaltado que além dos ministros reconhecerem o completo desacordo do artigo para com os regramentos constitucionais vigentes, ainda frisaram que tal disposição remonta outra época, e que nada tem de semelhante com a atual.

O então relator do RE, Ministro Gilmar Mendes fez questão de enfatizar:

“Não há como deixar de reconhecer o anacronismo do tipo penal que estamos a analisar. Não se pode admitir a punição do sujeito apenas pelo fato do que ele é, mas pelo que faz (…). Acolher o aspecto subjetivo como determinante para caracterização da contravenção penal equivale a criminalizar, em verdade, a condição pessoal e econômica do agente, e não fatos objetivos que causem relevante lesão a bens jurídicos importantes ao meio social”

Sem se debruçar sobre o referido decreto, vale dizer que outros de seus dispositivos merecem o mesmo destino. Embora tenha sido a decisão esperada para o julgamento do recurso, o que entristece é saber que vinte e cinco anos de vigor, não foram suficientes para exterminar do direito moderno, aberrações como a do artigo 25 da LCP.

Ao menos já se é possível saber qual opinião comunga a atual formação da Corte, a Constituição Federal de 1988, não admite, não tolera direito penal de autor.



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