Com a maturidade que se espera de uma
Corte que há vinte e cinco anos zela pela Constituição, julgando o RE
– Nº.583.523, o STF declarou como não recepcionado o artigo
25 da Lei de Contravenções Penais (LCP), Decreto-lei nº 3.688 de 1941.
A redação do artigo 25 da LCP é a
seguinte:
Art. 25. Ter
alguem em seu poder, depois de condenado, por crime de furto ou roubo, ou
enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo,
gazuas, chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na
prática de crime de furto, desde que não prove destinação legítima:
Pena – prisão
simples, de dois meses a um ano, e multa de duzentos mil réis a dois contos de
réis.
Nota-se que o aludido artigo considera
como infração penal a conduta daquele, já condenado por crime contra o
patrimônio ou que esteja respondendo o processo em liberdade, ou ainda, que
seja tido como vadio ou mendigo, que ele ande portando materiais usualmente
destinados à prática de crimes de furtos e roubos. E para essa conduta foi
especificada pena de prisão simples de dois meses a um ano e multa.
Analisando o tipo mencionado, mais
acertada não poderia ser a decisão da Corte, uma vez que a própria
Constituição, por meio de seus dispositivos, presa por um tratamento humano e
igualitário entre os iguais. Logo, punir alguém não por fazer determinado ato,
mas sim por ser ou ter características diferentes dos demais é claro direito
penal de autor.
Um dos maiores e mais fortes pilares da
Constituição 1988 é justamente a tão conhecida e declarada Igualmente. Esta que
deve nortear todo o ordenamento jurídico no que tange ao tratamento das
pessoas, por isso, permitir que alguém seja punido por ser diferente, viola
diretamente tal princípio. Além disso, o artigo 25 da LCP desalinha com outro
dispositivo constitucional que é justamente a presunção de não culpabilidade.
Sem falar é claro, que trata-se de infração penal de perigo abstrato, ou seja,
sem um mínimo de lesividade.
Importante dizer que a Corte foi unânime
na decisão de não recepção. Devendo ser ressaltado que além dos ministros reconhecerem
o completo desacordo do artigo para com os regramentos constitucionais
vigentes, ainda frisaram que tal disposição remonta outra época, e que nada tem
de semelhante com a atual.
O então relator do RE, Ministro Gilmar
Mendes fez questão de enfatizar:
“Não há como deixar de reconhecer o
anacronismo do tipo penal que estamos a analisar. Não se pode admitir a punição
do sujeito apenas pelo fato do que ele é, mas pelo que faz (…). Acolher o
aspecto subjetivo como determinante para caracterização da contravenção penal
equivale a criminalizar, em verdade, a condição pessoal e econômica do agente,
e não fatos objetivos que causem relevante lesão a bens jurídicos importantes
ao meio social”
Sem se debruçar sobre o referido
decreto, vale dizer que outros de seus dispositivos merecem o mesmo destino.
Embora tenha sido a decisão esperada para o julgamento do recurso, o que
entristece é saber que vinte e cinco anos de vigor, não foram suficientes para
exterminar do direito moderno, aberrações como a do artigo 25 da LCP.
Ao menos já se é possível saber qual
opinião comunga a atual formação da Corte, a Constituição Federal de 1988, não
admite, não tolera direito penal de autor.
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