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“O Direito Penal tem cheiro, cor, raça, classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado.” (Rogério Greco – Direito Penal do Equilíbrio)

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Jovem fica tetraplégico em luta de jiu-jitsu – SERÁ CASO DE EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO??

Ontem conversando com alguns alunos sobre um fato ocorrido neste último fim de semana, onde um adolescente ficou tetraplégico durante uma luta que se realizava em um torneio de jiu-jtsu no Espírito Santo, notei que tal fato gerou muita discussão entre eles, em especial sobre a possibilidade do outro lutador ser penalizado pelo fato e pela possibilidade de se aplicar no caso alguma das causas de justificação de um ilícito penal.

Claro que várias questões envolvendo o torneio devem ser melhores analisadas, principalmente no que tange as regras e condições em que se realizavam as lutas, pois já há várias informações, inclusive com opiniões de especialistas, dizendo que a luta não deveria ter ocorrido por vários fatores, mas ocorre que não nos cabe aqui tecer maiores comentários sobre tais indagações, até porque nem teríamos condições para fazê-los.

De outra feita, gostaria apenas de chamar atenções de vocês para o aspecto jurídico penal desse triste fato, envolvendo tão somente os lutadores e analisando para tanto o vídeo da luta.



A cena além de triste é muito forte, e o porquê de trazê-la até vocês é tão somente para que possamos fazer uma análise da ocorrência ou não do fenômeno jurídico que muitos falamos dentro de sala, que é a causa de justificação vista em virtude do exercício regular de um direito, este previsto no artigo 23, segunda parte do inciso III, do Código Penal.

Analisando o quadro do adolescente lesionado, ainda que se trate de uma lesão gravíssima, a capitulação a ser feita no caso não deve seguir para o campo do dolo, haja vista que não se pode afirmar que o outro lutador desejava diretamente o resultado visto. Por hora a situação esta muito mais para uma culpa consciente do que dolo eventual, mas não sendo surpresa caso este seja invocado no caso. Sendo assim, como fica a situação do outro lutador, que a princípio deve responder por lesão corporal culposa? E mais, qual a responsabilidade da comissão organizadora do evento que permitiu o embate?

Além de errado é por certo inseguro afirmar que em todos os casos de violência esportiva, se aplicará a justificante do exercício regular do direito, sem que antes, seja realizado um estudo prévio ou mesmo de uma análise pormenorizada do fato.

Como o próprio nome diz a ilicitude de um determinado fato deverá ser excluída se sua ocorrência origina-se diretamente da prática de um direito. Sendo assim, a pergunta que deve ser feita é: há um direito envolvido no caso? Qual seria ele?

Segundo lição de Paulo José da Costa Júnior:
“o conceito de direito, empregado pelo inciso III do art. 23, compreende todos os tipos de direito subjetivo, pertença eles a este ou àquele ramo do ordenamento jurídico – de direito penal, de outro ramo do direito público ou privado – podendo ainda tratar-se de norma codificada ou consuetudinária”.

No caso apresentado, os lutadores, enquanto participantes do evento, possuíam de fato o direito de lutar?

Parece ser simples a resposta, mas a análise que deve ser feita não é tão simples assim. Além de se verificar a permissão para lutar conferida aos participantes, o evento em si, isto é, o torneio preenchia as condições para sua realização, será que estava de acordo com as regras e normas que regulam a referida prática esportiva? Parece estar a ai o problema, posto que já se tem notícia que a luta não deveria ter sido realizada por serem os lutadores de categorias diferentes.

É imperiosa a observância, bem como o respeito para com os limites desse direito que se invoca para justificar a prática de um fato ilícito, pois havendo qualquer excesso no seu exercício, ele deixa de ser “REGULAR” e passa a ser “IRREGULAR”, e neste caso não se pode haver exclusão da ilicitude.

Sobre isso, o catedrático Cezar Roberto Bittencourt explicando justamente a necessidade de se ter cautela com os limites existentes no exercício regular de um direito, diz que: “termina necessariamente onde começa o abuso, posto que aí o direito deixa de ser exercido regularmente, para mostrar-se abusivo, caracterizando sua ilicitude”.

Por isso, é preciso ter cuidado antes de se invocar as causas de exclusão de ilicitude para uma determinada situação, sem que primeiro se realize uma análise cuidadosa sobre todos os fatos que se relacionam e que tenham antecedido o evento, em tese, ilícito. No caso noticiado, ficará agora à cargo da Policia Civil do ES, a tarefa de colher de todas as informações e levantar o máximo de dados que possa possibilitar a conclusão do fato, principalmente para responder: é ou não caso de exercício regular de um direito?


NOTÍCIA
JOVEM DE 15 ANOS FICA TETRAPLÉGICO APÓS GOLPE EM LUTA DE JIU-JITSU NO ES
Um garoto de 15 anos ficou tetraplégico no Espírito Santo após sofrer um golpe durante luta em um campeonato de jiu-jitsu. A luta ocorreu no dia 4 de agosto e o jovem, de nome Gabriel, segue internado em um hospital de Vila Velha.
Gabriel lutava contra um rapaz de 20 anos, da categoria adulta – ele está na categoria juvenil. A Federação de Jiu-Jitsu do Espírito Santo (FEJJES) permitia os combates entre atletas de categorias diferentes até o caso ocorrer. Segundo Agnaldo Góes, presidente do órgão, a partir de agora esses combates serão proibidos.
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