Julgando o RHC 51.531-RO,a 6ª
turma declarou ilícita a conversa extraída do whatzap sem autorização.
integra do julgado:
RECURSO EM
HABEAS CORPUS Nº 51.531 - RO (2014/0232367-7) RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO
RECORRENTE : LERI SOUZA E SILVA ADVOGADOS : ROBERTO PEREIRA SOUZA E SILVA E
OUTRO(S) BRUNO ESPINEIRA LEMOS RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
RONDÔNIA RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator): Trata-se de
recurso ordinário interposto por Leri Souza e Silva em face de acórdão
proferido pelo Tribunal de Justiça de Rondônia, que denegou a ordem em writ lá
impetrado. Afirma que após a apreensão do aparelho celular, sem qualquer
autorização, a polícia obrigatoriamente teria que ter oficiado do Juízo, com o
conhecimento do MP, antes de proceder à devassa unilateral no conteúdo do
aparato, que, necessariamente, teria que ser acompanhada pelo MP e especial
pela Defesa, diante dos riscos naturais do desvirtuamento, acréscimo e
exclusões do conteúdo a ser extraído (fl. 84). Alega que a prova obtida sem
requerimento ao Juiz natural (PERÍCIA DE, APARELHO CELULAR) que teve trâmite após
a detenção do Paciente, portanto, perícia realizada em objeto já apreendido e
sob a responsabilidade da Policia, sem que para isso houvesse sido requerida a
autorização judicial, com os consectários fiscalizadores e asseguradores daí
advindos viola os ditames do art. 5º, XII, da CF, sendo inadmissível a prova
obtida de forma ilícita (art. 5º, LVI/CF), do mesmo modo disciplinando o art.
157, do CPP, razões essas, mais que suficientes para o desentranhamento das
provas aqui mencionadas (fl. 93). Requer o provimento do recurso para que seja
reconhecida a ilegalidade da prova mediante o desentranhamento dos autos.
Contrarrazões opostas pelo Ministério Público (fls. 98/104). Informações
prestadas em 22/10/2015, indicam que o feito encontra-se concluso para sentença,
sendo que o paciente aguarda o processo em liberdade diante da decisão
proferida em sede de medida cautelar no habeas corpus 122.555/RO , impetrado
perante a Suprema Corte (fls. 125/144). O parecer Ministerial pelo
desprovimento do recurso (fls. 116/118). É o relatório. Documento: 54739651 -
RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 1 de 7 Superior Tribunal de Justiça
RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 51.531 - RO (2014/0232367-7) VOTO O EXMO. SR.
MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator): Consta dos autos que o paciente foi
denunciado pela prática dos crimes previstos nos arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06
e art. 329 do CP. Em 6/8/2014, a Corte Estadual denegou a ordem, consoante
acórdão assim ementado (fl. 61): Habeas corpus. Processo Penal. Tráfico de
drogas. Prova pericial. Nulidade. Transcrição de mensagens de texto gravadas no
aparelho apreendido. Inocorrência de prova ilícita. Ordem Denegada. 1 . É
válida a transcrição de mensagens de texto gravadas no aparelho celular
apreendido com o paciente por ocasião de sua prisão em flagrante pois estes
dados não gozam da mesma proteção constitucional de que trata o art. 5º, XII.
2. Ordem denegada. Neste recurso, busca-se a decretação da ilicitude das provas
extraídas do aparelho celular do recorrente dada a ausência de ordem judicial.
Extrai-se do voto condutor a seguinte fundamentação (fls. 64/66): Em breve
narrativa fática, consta dos autos que o paciente foi preso no dia 18/03/2014,
sob a acusação de praticar o delito de tráfico de entorpecentes e ainda
associação para o tráfico. A denúncia descreve que uma denúncia anônima
informou que no dia em que foi preso o paciente receberia, via correios, uma
carga de entorpecente. Foi realizado acompanhamento pela polícia militar e tão
logo a encomenda fora entregue realizaram a abordagem, logrando êxito em
apreender na posse do paciente um recipiente contendo 300 (trezentos)
comprimidos de ecstasy. Investigações complementares demonstraram que o
paciente se associou com os corréus com a finalidade específica de perpetrar o
delito de tráfico de entorpecentes, cada um exercendo uma tarefa específica. Em
informações apresentadas às fls. 40/42 a autoridade impetrada afirmou que o
aparelho de telefone celular foi apreendido com o paciente por ocasião de sua
prisão em flagrante, apontando que a perícia realizada no aparelho tem
fundamento no art. 6º, incs. II, III e VII do CPP. Informou ainda que o acesso
aos dados constantes do aparelho, no caso dos autos, não encontra o mesmo
impedimento da interceptação telefônica e que a autoridade policial agiu
estritamente para cumprimento da Lei. A discussão apresentada pelo impetrante
circunda a Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 2
de 7 Superior Tribunal de Justiça possibilidade de realização unilateral da
perícia no aparelho de telefone celular apreendido quando da prisão em
flagrante sem a alegada imprescindível autorização judicial. Entendo que a tese
apresentada pelo impetrante é desprovida de fundamento porquanto a proteção do
acesso aos dados constantes do aparelho não se assemelha à interceptação
telefônica. Inicialmente relato que o telefone celular foi apreendido no
momento da prisão em flagrante do paciente, ocasião em que os policiais
recolheram todos os instrumentos que poderiam estar relacionados ao crime, incluindo
este aparelho, encaminhando-o à autoridade policial competente. Após a
apreensão a autoridade policial conduziu a investigação conforme disposto no
art. 6º do CPP, determinando a realização de perícia do entorpecente apreendido
e ainda extração das conversações do aparelho celular do paciente. Assim dispõe
o referido texto legal: Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da
infração penal, a autoridade policial deverá: [...] II - apreender os objetos
que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;
(Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) III - colher todas as provas que
servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; [...] VII -
determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer
outras perícias; Nota-se que o legislador não atribuiu discricionariedade ao
ato impugnado, pelo contrário, determina que a autoridade policial realize as
ações descritas nos incisos do referido artigo. Entendo não ser imprescindível
a decisão judicial para realização de perícia em aparelho celular apreendido
pois a lei permite até mesmo a violação de domicílio para efetuar prisão em
flagrante. Relato ainda que o Direito Penal e Processual Penal possuem natureza
pública, geridos pelo Estado, representante das vontades e interesses da
coletividade. Cito este fato em razão do questionamento da atividade pericial
realizada, e saliento que a perícia foi realizada por agentes oficiais do
Estado, legalmente incumbidos da realização dos estudos realizados, recaindo
sobre eles a necessidade de observação explícita dos princípios constitucionais
da legalidade, moralidade, impessoalidade, dentre outros. Apresentar meras
ilações acerca da possibilidade de algum dos policiais prejudicar o paciente é
demasiadamente pueril, até mesmo porque não demonstrou objetivamente tal
condição, não sendo relatado em momento algum dos autos a preexistência de
qualquer animosidade pretérita ao fato. Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO
- Site certificado Página 3 de 7 Superior Tribunal de Justiça O fato é que ao
empossar um agente público em seu cargo o Estado lhe confia o poder conferido
pelo povo, presumindo-se legais os seus atos até ulterior conclusão contrária.
Observo ainda que o art. 159 do CPP exige a realização dos trabalhos periciais
por peritos oficiais, a saber: "Art. 159. O exame de corpo de delito e
outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de
curso superior." Sobre este tema, leciona Nucci (in Código de processo
penal comentado / 13. ed. rev. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2014) que
"perito é o especialista em determinado assunto. É considerado oficial
quando investido na função por lei e não pela nomeação feita pelo juiz.
Normalmente, é pessoa que exerce a atividade por profissão e pertence a órgão
especial do Estado, destinado exclusivamente a produzir perícias". Com
essas ponderações, considero válida a prova pericial decorrente da degravação
do conteúdo constante do aparelho celular do paciente, inexistindo ainda
qualquer ilegalidade a ser sanada. A Constituição Federal prevê como garantias
ao cidadão a inviolabilidade da intimidade, do sigilo de correspondência, dados
e comunicações telefônicas - salvo ordem judicial: Art. 5º. [...] X - são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação; [...] XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das
comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer
para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; No caso das
comunicações telefônicas, a Lei n. 9.294/96 regulamentou o tema: Art. 1º. A
interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em
investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto
nesta lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob
segredo de justiça. Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à
interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.
Art. 5º. A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a
forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias,
renovável por igual tempo uma vez Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site
certificado Página 4 de 7 Superior Tribunal de Justiça comprovada a
indispensabilidade do meio de prova. A Lei n. 9.472/97, ao dispor sobre a
organização dos serviços de telecomunicações, prescreve: Art. 3º. O usuário de
serviços de telecomunicações tem direito: [...] V - à inviolabilidade e ao
segredo de sua comunicação, salvo nas hipóteses e condições constitucional e
legalmente previstas; E a Lei 12.965/14, que estabelece os princípios,
garantias e deveres para o uso da Internet no Brasil, prevê que: Art. 7º. O
acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania, e ao usuário são
assegurados os seguintes direitos: I - inviolabilidade da intimidade e da vida
privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação; II - inviolabilidade e sigilo do fluxo de suas comunicações pela
internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei; III - inviolabilidade e
sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial;
[...] Na perícia realizada, houve acesso aos dados do celular e às conversas de
whatsapp obtidos sem ordem judicial. No acesso aos dados do aparelho, tem-se
devassa de dados particulares, com violação à intimidade do agente. Embora
possível o acesso, necessária é a prévia autorização judicial devidamente
motivada: RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE.
DILIGÊNCIAS PARA VERIFICAR O REGULAR CUMPRIMENTO DA PENA. DECISÃO DESPROVIDA DE
FUNDAMENTAÇÃO. 1. Embora não sejam absolutas as restrições de acesso à
privacidade e aos dados pessoais do cidadão, e mesmo considerado o interesse
público no acompanhamento da execução penal, imprescindível é a qualquer
decisão judicial a explicitação de seus motivos (art. 93, IX, da Constituição
Federal). 2. Diligências invasivas de acesso a dados (bancários, telefônicos e
de empresa de transporte aéreo) deferidas sem qualquer menção à necessidade e
proporcionalidade dessas medidas investigatórias, não propriamente de crime,
mas de regular cumprimento de pena imposta. Nulidade reconhecida. 3. Recurso
especial parcialmente provido. Documento: 54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site
certificado Página 5 de 7 Superior Tribunal de Justiça (REsp 1133877/PR, Rel.
Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 02/09/2014).
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. 1. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL.
VIOLAÇÃO AO ART. 157 DO CPP. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO PELO DELITO DO ART. 1º, I,
DA LEI N. 8.137/1990. QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA.
AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NULIDADE DA PROVA. 2. RECURSO ESPECIAL
PROVIDO. 1. Afigura-se decorrência lógica do respeito aos direitos à intimidade
e à privacidade (art. 5º, X, da CF) a proibição de que a administração
fazendária afaste, por autoridade própria, o sigilo bancário do contribuinte,
especialmente se considerada sua posição de parte na relação
jurídico-tributária, com interesse direto no resultado da fiscalização. Apenas
o Judiciário, desinteressado que é na solução material da causa e, por assim
dizer, órgão imparcial, está apto a efetuar a ponderação imprescindível entre o
dever de sigilo - decorrente da privacidade e da intimidade asseguradas ao
indivíduo, em geral, e ao contribuinte, em especial - e o também dever de
preservação da ordem jurídica mediante a investigação de condutas a ela
atentatórias. 2. Recurso especial a que se dá provimento para reconhecer a
ilicitude da prova advinda da quebra do sigilo bancário sem autorização judicial,
determinando-se que seja proferida nova sentença, afastada a referida prova
ilícita e as eventualmente dela decorrentes. (REsp 1361174/RS, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 10/06/2014).
Na conversas mantidas pelo programa whatsapp , que é forma de comunicação
escrita, imediata, entre interlocutores, tem-se efetiva interceptação
inautorizada de comunicações. É situação similar às conversas mantidas por
e-mail, onde para o acesso tem-se igualmente exigido a prévia ordem judicial:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO REVELAÇÃO. CORRUPÇÃO ATIVA. MEDIDAS
CAUTELARES DETERMINADAS. AFASTAMENTO DE SIGILO DE CORREIO ELETRÔNICO. DURAÇÃO
DA CONSTRIÇÃO. PRAZO: DE 2004 A 2014. FUNDAMENTAÇÃO PARA A QUEBRA DO SIGILO DO
E-MAIL NO PERÍODO. AUSÊNCIA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. NÃO OBSERVÂNCIA.
OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. FLAGRANTE ILEGALIDADE. EXISTÊNCIA. ORDEM
CONCEDIDA. 1. A quebra do sigilo do correio eletrônico somente Documento:
54739651 - RELATÓRIO E VOTO - Site certificado Página 6 de 7 Superior Tribunal
de Justiça pode ser decretada, elidindo a proteção ao direito, diante dos
requisitos próprios de cautelaridade que a justifiquem idoneamente, desaguando
em um quadro de imprescindibilidade da providência. 2. In casu, a constrição da
comunicação eletrônica abrangeu um ancho período, superior a dez anos, de 2004
a 2014, sem que se declinasse adequadamente a necessidade da medida extrema ou
mesmo os motivos para o lapso temporal abrangido, a refugar o brocardo da
proporcionalidade, devendo-se, assim, prevalecer a garantia do direito à
intimidade frente ao primado da segurança pública. 3. Lastreadas as decisões de
origem em argumentos vagos, sem amparo em dados fáticos que pudessem dar azo ao
procedimento tão drástico executado nos endereços eletrônicos do acusado, de se
notar certo açodamento por parte dos responsáveis pela persecução penal. 4.
Ordem concedida, com a extensão aos co-investigados em situação análoga, a fim
de declarar nula apenas a evidência resultante do afastamento dos sigilos de
seus respectivos correios eletrônicos, determinando-se que seja desentranhado,
envelopado, lacrado e entregue aos respectivos indivíduos o material decorrente
da medida. (HC 315.220/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 15/09/2015, DJe 09/10/2015). Atualmente, o celular deixou de
ser apenas um instrumento de conversação pela voz à longa distância,
permitindo, diante do avanço tecnológico, o acesso de múltiplas funções,
incluindo, no caso, a verificação da correspondência eletrônica, de mensagens e
de outros aplicativos que possibilitam a comunicação por meio de troca de dados
de forma similar à telefonia convencional. Deste modo, ilícita é tanto a
devassa de dados, como das conversas de whatsapp obtidos de celular apreendido,
porquanto realizada sem ordem judicial. Ante o exposto, voto por dar provimento
ao recurso ordinário em habeas corpus, para declarar a nulidade das provas
obtidas no celular do paciente sem autorização judicial, cujo produto deve ser
desentranhado dos autos.
Fonte:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?num_registro=201402323677&aplicacao=processos.ea