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“O Direito Penal tem cheiro, cor, raça, classe social; enfim, há um grupo de escolhidos, sobre os quais haverá a manifestação da força do Estado.” (Rogério Greco – Direito Penal do Equilíbrio)

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Questões Corrigidas e Comentadas da Prova de Penal - 2ª Fase. OAB – XV Exame Unificado FGV





Questões Corrigidas e Comentadas da Prova de Penal - 2ª Fase.
OAB – XV Exame Unificado FGV

2ª Fase (aplicada em 11/01/2015)

PEÇA PRÁTICO-PROFISSIONAL
Enrico, engenheiro de uma renomada empresa da construção civil, possui um perfil em uma das redes sociais existentes na Internet e o utiliza diariamente para entrar em contato com seus amigos, parentes e colegas de trabalho. Enrico utiliza constantemente as ferramentas da Internet para contatos profissionais e lazer, como o fazem milhares de pessoas no mundo contemporâneo. No dia 19/04/2014, sábado, Enrico comemora aniversário e planeja, para a ocasião, uma reunião à noite com parentes e amigos para festejar a data em uma famosa churrascaria da cidade de Niterói, no estado do Rio de Janeiro. Na manhã de seu aniversário, resolveu, então, enviar o convite por meio da rede social, publicando postagem alusiva à comemoração em seu perfil pessoal, para todos os seus contatos. Helena, vizinha e ex-namorada de Enrico, que também possui perfil na referida rede social e está adicionada nos contatos de seu ex, soube, assim, da festa e do motivo da comemoração. Então, de seu computador pessoal, instalado em sua residência, um prédio na praia de Icaraí, em Niterói, publicou na rede social uma mensagem no perfil pessoal de Enrico. Naquele momento, Helena, com o intuito de ofender o ex-namorado, publicou o seguinte comentário: “não sei o motivo da comemoração, já que Enrico não passa de um idiota, bêbado, irresponsável e sem vergonha!”, e, com o propósito de prejudicar Enrico perante seus colegas de trabalho e denegrir sua reputação acrescentou, ainda, “ele trabalha todo dia embriagado! No dia 10 do mês passado, ele cambaleava bêbado pelas ruas do Rio, inclusive, estava tão bêbado no horário do expediente que a empresa em que trabalha teve que chamar uma ambulância para socorrê-lo!”.  Imediatamente, Enrico, que estava em seu apartamento e conectado à rede social por meio de seu tablet, recebeu a mensagem e visualizou a publicação com os comentários ofensivos de Helena em seu perfil pessoal. Enrico, mortificado, não sabia o que dizer aos amigos, em especial a Carlos, Miguel e Ramirez, que estavam ao seu lado naquele instante. Muito envergonhado, Enrico tentou disfarçar o constrangimento sofrido, mas perdeu todo o seu entusiasmo, e a festa comemorativa deixou de ser realizada. No dia seguinte, Enrico procurou a Delegacia de Polícia Especializada em Repressão aos Crimes de Informática e narrou os fatos à autoridade policial, entregando o conteúdo impresso da mensagem ofensiva e a página da rede social na Internet onde ela poderia ser visualizada. Passados cinco meses da data dos fatos, Enrico procurou seu escritório de advocacia e narrou os fatos acima. Você, na qualidade de advogado de Enrico, deve assisti-lo. Informa-se que a cidade de Niterói, no Estado do Rio de Janeiro, possui Varas Criminais e Juizados Especiais Criminais. 
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça cabível, excluindo a possibilidade de impetração de habeas corpus, sustentando, para tanto, as teses jurídicas pertinentes. (Valor: 5,00 pontos) 
A peça deve abranger todos os fundamentos de Direito que possam ser utilizados para dar respaldo à pretensão

Prezados alunos, surpreendendo à todos a prova da ordem trouxe um caso de ação penal privada para a sua segunda fase.
Preparei para vocês, enquanto esperam a divulgação do resultado final, um pequeno esboço sobre a peça e sobre as respostas das questões.

Seguindo a lógica da estrutura de petição, esses são os elementos:

1 - CLIENTE: Quanto a isso não há dificuldade, pois o problema deixou claro que foi o ofendido (Enrico) quem teria procurado o escritório. Nessa questão em especial era importante não errar o cliente, pois caso o aluno fizesse confusão poderia perder toda a peça, haja vista que no caso do ofendido a peça é a queixa crime, mas se fosse para a ofensora (Helena) seria resposta escrita a acusação.

2 - CRIME/PENA: Pelos dados é de se impor que houve concurso de crimes, formal na verdade, mas com desígnios autônomos.
Sendo esse o quadro: (artigos 139 e 140, c/c o Art. 141, III, n/f Art. 70, todos do CP).
Difamação
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Injúria
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Disposições comuns
Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.
Concurso formal
Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.

3 - AÇÃO PENAL: Por se tratar de crimes contra a honra, estabeleceu o legislador como regra que para serem apurados pela justiça é preciso que a vítima inicie o processo. A existência da ação penal privada esta consubstanciada na lei.
No Código Penal:
Ação pública e de iniciativa privada

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. 

§ 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. 

§ 2º - A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo. 

§ 3º - A ação de iniciativa privada pode intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal. 

§ 4º - No caso de morte do ofendido ou de ter sido declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou de prosseguir na ação passa ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. 

No Código de Processo Penal

Art. 30.  Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação privada.


Como sabemos, para saber se um crime é de ação penal privada ou pública devemos verificar se há disposição no próprio artigo que faz previsão da infração ou então nos artigos seguintes dentro do mesmo título.
Sobre os crimes praticados no problema, disse o legislador sobre eles:
Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.


4 - RITO PROCESSUAL/PROCEDIMENTO: Como o Código de Processo Penal fez previsão de um procedimento especial para essa espécie de crime, o correto no caso, pelo principio da especialidade, é aplicar o procedimento especial previsto (artigos. 519/523 do CPP).
Ocorre que como o processo ainda não teve início, não se tem relevância no momento de se fazer tal verificação, posto que para tudo é preciso primeiro dar entrada no processo crime.


5 - MOMENTO PROCESSUAL: Ainda não há processo, portando, deve ser feito o primeiro passo, isto é, a petição inicial.

6 - PEÇA: Conforme vimos no momento processual, como ainda não há processo deveria o aluno redigir o que seria a petição inicial no caso. Como é uma inicial de um processo criminal, cuja ação é privada, o correto seria redigir uma queixa crime.
O fundamento e os requisitos de tal petição estão no artigo 41 do CPP, que diz:
Art. 41.  A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

Além desse, importante fazer menção aos artigos 100, § 2º, do CP, e o artigo 30 do CPP, que fazem previsão da modalidade de ação.


7 - COMPETÊNCIA: A competência para julgamento seria de um dos juizados especiais criminais da cidade de Niterói/RJ.


Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(íza) de direito Do ... Juizado Especial Criminal de Niterói/RJ



8.     TESES:

Diferente das outras petições defensivas que normalmente são pedidas no exame de ordem, a queixa crime se diferencia delas primeiro por possuir teor acusatório, e segundo por não exigir do aluno toda a variedade de teses que comumente são pedidas.

A queixa crime seguindo o formato que a lei estabelece no artigo 41 do CPP, deveria trazer a qualificação da parte querelante e da parte querelada. Em seguida um breve relatório dos fatos, seguido da exposição do direito. Neste ponto o candidato faria a demonstração da conduta da querelada e como que ela se adequou tipicamente aos crimes dos artigos 139 e 140, ambos do CP, na forma de concurso formal impróprio.

Deveria ainda fazer explanação sobre a causa de aumento de pena prevista no artigo 141, inciso III do CP.


OBS: normalmente quando a peça cobrada é queixa crime, é prudente que o candidato faça também a procuração nos moldes do artigo 44 do CPP, especificando sobremaneira o nome do querelante e a menção do fatos criminosos.


9.      PEDIDOS

Quanto aos pedidos, eles deveriam ser feitos na seguinte ordem:

- A condenação da querelada nas penas dos crimes previsto nos artigos 139 e 140 c/c o Art. 141, III, na forma do concurso formal do artigo 70, todos do CP; OBS – deixando de fazer esse pedido toda a peça perde se fundamento em razão a perempção.


- Pedir a citação da querelada;

- A condenação da querelada ao pagamento de indenização ao querelante – art.387, IV do CPP;

- A condenação da querelada nas custas processuais;

- A intimação das oitivas abaixo arrolada. OBS – o problema forneceu dado que permitiria ao aluno formular o rol de testemunha. Constou: “não sabia o que dizer aos amigos, em especial a Carlos, Miguel e Ramirez, que estavam ao seu lado naquele instante”


10. DATA DO PROTOCOLO

Normalmente, nas peças defensivas, a data pedida é uma específica, pois tem que se de acordo como prazo de cada uma das peças que são cobradas. Como no caso da queixa crime não existe um prazo certo, o único cuidado que o aluno deveria ter era de não datar a peça com data que ultrapasse o prazo de seis meses da prática do crime, haja vista a decadência que impera após esse período conforme artigo 103 do CP e artigo 39 do CPP.





Questões
QUESTÃO 1
Miguel foi condenado pela prática do crime previsto no Art. 157, § 2º, inciso V, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 05 anos e 04 meses de reclusão e 13 dias-multa. Após cumprir 04 anos da reprimenda penal aplicada, foi publicado, no dia 24/12/2013, um Decreto prevendo que caberia indulto para o condenado à pena privativa de liberdade não superior a 08 anos que tivesse cumprido 1/3 da pena, se primário, ou 1/2, se reincidente, além da inexistência de aplicação de sanção pela prática de falta grave nos 12 meses anteriores ao Decreto. Cinco dias após a publicação do Decreto, mas antes de apreciado seu pedido de indulto, Miguel praticou falta grave, razão pela qual teve seu requerimento indeferido pelo Juiz em atuação junto à Vara de Execução Penal. 
Considerando apenas as informações contidas na presente hipótese, responda aos itens a seguir. 
A) Qual medida processual, diferente do habeas corpus, deve ser adotada pelo advogado de Miguel e qual seria o seu prazo? (Valor: 0,75)
B) Miguel faz jus ao benefício do indulto? (Valor: 0,50)

RESPOSTAS:

A) Por se tratar de decisão vista no curso da execução da pena, o correto no caso é a interposição de um agravo em execução conforme artigo 197da lei de execuções penais (7.210/84).
Art. 197. Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de agravo, sem efeito suspensivo.
Importante observar também disposição da súmula 700 do STF:
Súmula 700: É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal.

B) Por uma questão de tempo, terá o reeducando o direito a tal benesse, haja vista que praticou a falta após a publicação do decreto e não antes como estava previsto. Por isso terá sim o direito.


QUESTÃO 2 
Durante inquérito policial que investigava a prática do crime de extorsão mediante sequestro, esgotado o prazo sem o fim das investigações, a autoridade policial encaminhou os autos para o Judiciário, requerendo apenas a renovação do prazo. O magistrado, antes de encaminhar o feito ao Ministério Público, verificando a gravidade em abstrato do crime praticado, decretou a prisão preventiva do investigado. 
Considerando a narrativa apresentada, responda aos itens a seguir. 
A) Poderia o magistrado adotar tal medida? Justifique. (Valor: 0,65)
B) A fundamentação apresentada para a decretação da preventiva foi suficiente? Justifique. (Valor: 0,60)

RESPOSTAS:

A) Não. Depois das mudanças promovidas pela Lei nº12.403/11, o magistrado ficou impedido de decretar de ofício da prisão preventiva na fase investigativa. Isso se extrai pela interpretação do artigo 311 do CPP:
Art. 311.  Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial
OBS – A exceção será apenas nos casos de aplicação da Lei 12.340/06.  Nos casos de violência doméstica em razão de gênero contra a mulher poderá o magistrado ainda que na fase policial decretar a prisão do agressor.

B) Outra importante mudança promovida pela Lei nº 12.403/11, foi a necessidade do juiz quando for decretar a prisão de alguém, assim fazer de forma devidamente fundamentada. Respondendo a pergunta, a fundamentação do juiz não foi suficiente, pois não fez ele por explicar e fundamentar, principalmente, a necessidade da medida.
OBS – O problema também não forneceu dados suficientes para se responder essa questão B.

QUESTÃO 3 
A Receita Federal identificou que Raquel possivelmente sonegou Imposto sobre a Renda, causando prejuízo ao erário no valor de R$27.000,00 (vinte e sete mil reais). Foi instaurado, então, procedimento administrativo, não havendo, até o presente momento, lançamento definitivo do crédito tributário. Ao mesmo tempo, a Receita Federal expediu ofício informando tais fatos ao Ministério Público Federal, que, considerando a autonomia das instâncias, ofereceu denúncia em face de Raquel pela prática do crime previsto no Art. 1º, inciso I, da Lei nº8.137/90. Assustada com a ratificação do recebimento da denúncia após a apresentação de resposta à acusação pela Defensoria Pública, Raquel o procura para, na condição de advogado, tomar as medidas cabíveis. 
Diante disso, responda aos itens a seguir. 
A) Qual a medida jurídica a ser adotada de imediato para impedir o prosseguimento da ação penal? (Valor:
0,60)
B)  Qual a principal tese jurídica a ser apresentada? (Valor: 0,65) 

RESPOSTAS

A) Considerando que o crime em questão só se considera praticado após o lançamento do crédito, e considerando que no caso isso não se observou, conclui-se que o fato ainda não havia se tornado típico. Desse modo, considerando que o fato é atípico o correto será a impetração de um HC visando o trancamento da ação penal.

B) A ausência de tipicidade é a tese central do habeas Corpus, pois mesmo sem ter havido o enquadramento típico da conduta de Raquel o promotor já denunciou e o juiz recebeu. De forma que ela esta respondendo um processo que não deveria sequer existir. A base jurídica para a fundamentação é a sumula vinculante 24 do STF que diz:
Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.


QUESTÃO 4 
No dia 06/07/2010, Júlia, nascida em 06/04/1991, aproveitando-se de um momento de distração de Ricardo, subtraiu-lhe a carteira. Após recebimento da denúncia, em 11/08/2011, e regular processamento do feito, Júlia foi condenada a uma pena privativa de liberdade de 01 ano de reclusão, em sentença publicada em 08/10/2014. Nem o Ministério Público nem a defesa de Júlia interpuseram recurso, tendo o feito transitado em julgado em 22/10/2014. 
Sobre esses fatos, responda aos itens a seguir. 
A) Diante do trânsito em julgado, qual a tese defensiva a ser alegada em favor de Júlia para impedir o cumprimento da pena? (Valor: 0,75)
B) Quais as consequências do acolhimento da tese defensiva? (Valor: 0,50) 

RESPOSTAS

A) Considerando que na data do crime ela possuía apenas 19 anos, a contagem da prescrição para ela é feito de metade segundo previsão do artigo 115 do CPP. Como a pena aplicada na condenação foi de um ano, o que por interpretação do artigo 109, inciso V do CP, a prescrição nesse caso deveria ser de quatro anos, mas como conta de mate será, portanto de 2 anos.
Considerando que entre o recebimento da denúncia (11/08/2011) e a publicação da sentença (08/10/2014) passaram-se três anos, verifica-se, portanto, que ela não poderá cumprir a pena haja vista a prescrição retroativa que ocorreu no caso.

B) A declaração da extinção de punibilidade conforme artigo 107, inciso IV do CP.

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