Fabricio da Mata Corrêa
Depois
de pensar sobre o assunto e estudar melhor a nova estrutura típica e suas
implicações práticas, mudando posição anteriormente apresentada sobre as
alterações promovidas pela lei 12.760/12, cujas razões, parafraseando o imortal
Machado de Assis “É o que vais entender, lendo.”
Passados alguns meses desde que
entrou em vigor a lei 12.760/12, responsável por alterar
dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), e superado principalmente o período crítico do carnaval,
época em que sabidamente abusos envolvendo o uso de bebidas e outras substâncias
no trânsito são constantes, já se é possível verificar como que as novas regras
estão sendo aplicadas, e principalmente qual a eficácia prática e jurídica que
se pode extrair de tais medidas.
Antes, porém, até para se
estabelecer um comparativo envolvendo a questão específica do álcool na direção
de veículo automotor, vale lembrar a antiga redação do artigo 306 do CTB, que assim dizia:
Art. 306. Conduzir
veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool
por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a
influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
Da antiga redação já se era
possível notar que o legislador, preocupando-se em tutelar a segurança viária
(crime de perigo abstrato) especificou num único tipo penal duas espécies de
elementares, uma descritiva que é o caso do álcool e outra normativa valorativa
quando se referia a outras substâncias.
Pois bem, considerando a
distinção entre as elementares, fez o legislador por estabelecer que em se
tratando de álcool o método de constatação e dosagem seria pela perícia
técnica, ou seja, pela aferição exata da concentração no organismo do indivíduo,
enquanto que de outro modo, em se
tratando de outras de substâncias psicoativas que pudessem determinar
dependência, e claro, comprometer a condução do veículo, bastaria nesse caso a
simples identificação da influência dessas substâncias no comportamento do
individuo.
Entretanto, problema que sempre
se enfrentou na prática, e que na verdade foi o principal motivador para a
recente mudança, refere-se à questão do álcool, que conforme dito exigia prova
pericial, ou seja, para se imputar a prática do crime do artigo 306 do CTB, não bastava a simples influência ou
sua constatação pela autoridade, no caso do álcool exigiu-se mais, além da
influência que já era subentendida, exigiu-se ainda a necessária constatação da
concentração de 6 (seis) decigramas por litro de sangue para que só assim o
crime estivesse configurado.
Consequentemente, a norma do
artigo 306 do CTB, no que se refere
ao trato do álcool, só possuía eficácia prática quando o agente infrator,
voluntariamente, se submetia aos exames a fim de verificar qual a real
concentração de álcool no seu organismo. Tratava-se, portanto, de uma norma
penal incriminadora cuja aplicação estava condicionada à vontade do próprio
agente infrator, haja vista que pelo princípio do nemo tenetur se detegere, ninguém é obrigado a se autoincriminar. Portanto,
a recusa na realização da prova técnica passou a ser verdadeiro “escudo” para
os infratores e obstáculo para a aplicação da lei, pois impedia que a norma
penal alcançasse àqueles que não a respeitavam.
Toda essa situação gerou grande
instabilidade e revolta por parte da sociedade, que diariamente passou conviver
com cenas de condutores visivelmente embriagados, livrando-se da imputação da
prática do crime do art.306 do CTB,
simplesmente por se recusarem a fazerem os exames. Tamanha foi a indignação com
tal situação, que a partir daí viu-se surgir, principalmente nos meios de
comunicação, movimentos dos mais variados possíveis visando tão somente
pressionar o legislativo brasileiro, a fim de que fosse providenciada uma
reforma legislativa.
Em apertada síntese, esse foi o
motivo que levou o legislativo brasileiro a criar a já referida lei 12.760/12. De pronto, verifica-se que
visando atender os anseios sociais o legislador, a seu modo, reformulou o teor
do artigo 306 do CTB, o deixando da
seguinte forma:
Art. 306. Conduzir veículo automotor com capacidade
psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância
psicoativa que determine dependência:
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e
suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir
veículo automotor.
Parágrafo único. O Poder Executivo federal
estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de
caracterização do crime tipificado neste artigo.
§ 1o As condutas previstas no caput serão
constatadas por:
I
- concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue
ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou
II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo
Contran, alteração da capacidade psicomotora.
§ 2o A verificação do disposto neste artigo poderá
ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova
testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito
à contraprova.
§ 3o O Contran disporá sobre a equivalência entre os
distintos testes de alcoolemia para efeito de caracterização do crime
tipificado neste artigo.
Doravante, complementando a lei e visando padronizar esses novos
meios de prova, o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) editou e publicou no
dia 23 de janeiro de 2013 a RESOLUÇÃO Nº 432, que especificamente sobre o crime do art.
306 disse:
DO
CRIME
Art.
7º O crime previsto no art. 306 do CTB será caracterizado por qualquer um dos procedimentos
abaixo:
I
– exame de sangue que apresente resultado igual ou superior a 6 (seis)
decigramas de álcool por litro de sangue (6 dg/L);
II
- teste de etilômetro com medição realizada igual ou superior a 0,34 miligrama
de álcool por litro de ar alveolar expirado (0,34 mg/L), descontado o erro
máximo admissível nos termos da “Tabela de Valores Referenciais para
Etilômetro” constante no Anexo I;
III
– exames realizados por laboratórios especializados, indicados pelo órgão ou
entidade de trânsito competente ou pela Polícia Judiciária, em caso de consumo
de outras substâncias psicoativas que determinem dependência;
IV – sinais de alteração da
capacidade psicomotora obtido na forma do art. 5º.
§
1º A ocorrência do crime de que trata o caput não elide a aplicação do
disposto no art. 165 do CTB.
§
2º Configurado o crime de que trata este artigo, o condutor e testemunhas, se
houver, serão encaminhados à Polícia Judiciária, devendo ser acompanhados dos
elementos probatórios.
Complementando o inciso IV do
artigo 7º da resolução, tem-se, no mesmo expediente, a redação do artigo 5º,
que diz:
DOS
SINAIS DE ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA
Art.
5º Os sinais de alteração da capacidade psicomotora poderão ser verificados
por:
I
– exame clínico com laudo conclusivo e firmado por médico perito; ou
II – constatação, pelo agente
da Autoridade de Trânsito, dos sinais de alteração da capacidade psicomotora
nos termos do Anexo II.
§ 1º Para confirmação da
alteração da capacidade psicomotora pelo agente da Autoridade de Trânsito,
deverá ser considerado não somente um sinal, mas um conjunto de sinais que
comprovem a situação do condutor.
§
2º Os sinais de alteração da capacidade psicomotora de que trata o inciso II
deverão ser descritos no auto de infração ou em termo específico que contenha
as informações mínimas indicadas no Anexo II, o qual deverá acompanhar o auto
de infração.
Não se nega, e de fato salta
aos olhos sem dificuldade, que o legislador no ânsia de se tentar resolver o
problema, fez constar na lei e na referida resolução várias formas de se constatar
a alteração da capacidade psicomotora do agente de forma a não ser mais o exame
pericial o único meio. Pois bem, diante de todo esse trabalho do legislativo,
primeiro com a lei depois com a resolução, não há como negar que para resolver
o problema, bastaria a lei 12.760/12, ter suprimido a elementar descritiva dos
seis decigramas.
Entretanto, tendo seguido por
outro caminho, em prima análise, o que se extrai do “caput” do novo artigo 306 do CTB
é que a verificação da alteração da capacidade psicomotora continuou a ser feita
de duas maneiras, uma oriunda do uso de álcool e outra por meio de outras substâncias.
Tanto foi assim, que tornou o
legislador a repetir no seu inciso I que em se tratando de álcool a constatação
continua a ser por meio de exame pericial, ou seja, “concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de
sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar;
ou”. Além de não retirar do
texto de lei a elementar descritiva dos seis decigramas à complementou com o
exame feito pelo conhecido bafômetro. Perdendo assim a real oportunidade de
sanar o problema.
Enquanto que no
inciso II, visando possibilitar a verificação da alteração da capacidade
psicomotora, sem fazer menção ao álcool,
o legislador deixou a cargo do CONTRAN a tarefa de estabelecer outras formas,
que não às vistas no inciso I, vez que estas são específicas para o álcool,
estabelecendo assim outros meios e procedimentos de se constatar a presença de
substâncias no organismo do condutor.
Conclui-se, portanto,
considerando a nova redação do artigo 306, que o agente só responderá pelo
crime com base no inciso I, se optar e concordar em fazer o exame pericial ali
previsto, do contrário, se recusando a fazer tal teste ainda que esteja sob os
efeitos do álcool, por não possuir exame pericial capaz de afirmar a natureza e
quantidade da substância, continuará a responder pelo crime do art. 306, porém,
com fundamento no inciso II, ou seja, que esta sob a influência de alguma
substância (que não se sabe ser álcool), e que a mesma estaria comprometendo
sua capacidade psicomotora.
A bem da verdade, nota-se que o
inciso II do artigo 306 do CTB possui
caráter subsidiário, ou seja, só cuida daquilo que não for possível de ser
tratado pelo inciso I, ficando então com caráter residual. O que é
perfeitamente compreensível, posto que se diante de uma situação real de perigo,
representada pela alteração psicomotora do condutor, pouco importa saber qual a
real substância que esta agindo em seu organismo, basta para a configuração do
crime que fique evidenciado por todos os sinais possíveis que o agente não
possuía reais condições de conduzir veículo de modo seguro.
Sobrevém que, por depender dessa
constatação fática de que o agente não possuía reais condições de conduzir seu
veículo com segurança, há, portanto, a necessidade de que tais sinais e
características sejam irrefutáveis, fazendo desse modo, a nosso ver, com que o
crime do artigo 306, inciso II do CTB,
passe a ser de perigo concreto, ou seja, diante da impossibilidade de se
realizar o procedimento do inciso I (que continua sendo de perigo abstrato), de
forma subsidiária passa-se a aceitar os métodos do inciso II, desde que por
eles se prove de forma verossímil que houve risco concreto de dano.
Em resumo, o crime do artigo 306, inciso I do CTB, assim como já era, continua sendo
de perigo abstrato. De forma contrária e inovando o assunto, para a
configuração do inciso II do mesmo artigo, por depender da constatação feita por
meio do maior numero de sinais possíveis da alteração psicomotora do agente,
impossível dissociar tal alteração da efetiva necessidade de se demonstrar a
representação de um risco concreto de dano.
Em idêntico sentido, e na verdade até mais
simples, tem-se o crime do artigo 309 do CTB,
que considera crime de perigo concreto o fato de dirigir sem ser habilitado.
Ora, se não ser habilitado constitui crime de perigo concreto, a contrário
senso, ser habilitado e conduzir o veículo de forma anormal por conta da
alteração psicomotora, por medida de proporcionalidade, deve receber o mesmo
tratamento.
Outrossim, reforçando o aspecto material do
inciso II do artigo 306 CTB, vale a
comparação feita com o também crime de trânsito visto porém no artigo 308, que
consiste na participação de corrida, disputa ou competição
em via pública, sem autorização da
autoridade competente, revelando-se também como crime de perigo concreto. O
raciocínio é simples, aquele que conduz veículo com sua capacidade psicomotora
alterada, gera o mesmo perigo daquele que participa de corrida, disputa ou
competição em via pública, ou seja, trata-se de perigo concreto de dano.
Analisando as situações suso exemplificadas, nota-se que a
natureza das infrações são semelhantes, e por isso, representam, ou melhor,
traduzem por suas normas a necessidade de comprovação de um perigo concreto de
ano, ou seja, o perigo de dano traduzido pela conduta alterada passa a ser
elementar do inciso II do artigo 306 do CTB,
fazendo com que o crime nessa caso seja de perigo concreto.
O tema por si só não é novo,
mas a forma de vê-lo é que mudou e justamente por isso ainda não se é possível
verificar mudança nos posicionamentos já conhecidos dos tribunais superiores. Sendo
assim, vale dizer que atualmente o crime do artigo 306 do CTB, continua a ser visto como crime de perigo abstrato.
Como já foi dito, não se nega
que tanto a alteração vista na lei como por todas as possibilidades também
apresentadas pela resolução 432 do CONTRAN, tornaram bem mais fácil a constatação
do comprometimento da capacidade psicomotora do agente, seja em razão de álcool
ou de outras substâncias. E motivado por toda essa “facilidade”, faz-se
imperioso questionar se tais meios subjetivos de verificação, se revestem, na
prática, da legalidade necessária para serem considerados instrumentos
informadores válidos de um processo penal, bem como se são suficientes para
auxiliar e sustentar uma imputação criminal.
Comentando o assunto o
brilhante professor Luiz Flávio Gomes disse que:
“(...) Agora o nova lei seca
corre o risco de também “não pegar” porque a interpretação está sendo malfeita.
Se o critério é quantitativo, basta que o condutor se recuse a fazer o
etilômetro ou o exame de sangue. Restarão os sinais. Ocorre que os sinais são
de valoração subjetiva. O policial pára o condutor e nota sinais de embriaguez.
Onde vai enquadrá-lo? Na infração administrativa ou no crime? Aqui não existe
base para o critério quantitativo. Tudo depende da valoração do policial e,
depois, do juiz.”
A inovação, portanto, só possui
aplicação prática quando o agente se recusa a fazer o referido exame, momento
este que nasce para o Estado o direito de lançar mão de desses vários sinais e
características, que servem à autoridade com o fim de auxiliá-la na constatação
da efetiva alteração psicomotora do agente. Ocorre que tal verificação na
prática, ainda que subsidiária, não deve ser vista como um substituto do
bafômetro, pois não é, deve ser vista como um meio de prova qualquer, que assim
como todas as outras previstas em lei devem guardar respeito com a Constituição.
A necessidade de se distinguir
o exame pericial do inciso I do art. 306, dos outros meios de prova vistos no
inciso II e complementados pela resolução, faz-se necessário posto que, embora
presentes no mesmo tipo penal, se prestam à finalidades distintas até com valoração
diferenciada.
E por ser assim é que certamente
tal situação desafiará na prática muitas questões, como por exemplo: imagine o
individuo que faz o bafômetro e não atinge a marca da lei, mas em contra
partida reúne algumas das características vistas na resolução como agressividade,
arrogância, exaltação, ironia, falante, dispersão (conforme Anexo II, inciso VI, letra B, itens I ao V Da Resolução 432). Nesse caso o que se levará em
conta, o resultado obtido pela perícia ou o instrumento informativo
confeccionando pela autoridade fiscalizante? Qual teria maior peso? E mais, se
consideraria nesse momento o in dubio pro
societate ou pro réu?
Ao que parece, diante das mudanças promovidas, o
fato do legislador ter mantido os exames periciais no inciso I do artigo 306, isso
certamente servirá para auxiliar não só o Estado como também o próprio agente
possibilitando que o mesmo demonstre não ter feito uso de bebida alcoólica, ou ainda,
no caso de ter feito, demonstrar que não atingiu o limite previsto na lei.
Neste caso, a alteração estaria lhe servindo como uma espécie de “excludente”,
posto que ainda que o agente apresente no momento da abordagem sinais como: sonolência, olhos vermelhos, odor de álcool no hálito (conforme Anexo II, inciso VI, letra A,
itens I, II e VI Da Resolução 432), ainda assim, caso
o resultado do bafômetro indique que ele não atingiu a concentração vista na
lei, e considerando que sua direção não apresentava risco, nada lhe poderia ser imputado.
Toma-se essa posição, pois a
identificação do uso do álcool feita por meio de exames clínicos, ainda que
sujeitas ao contraditório e a ampla defesa, tamanha é a objetividade e clareza que
fornecem ao processo que, geralmente, poucas são as saídas para a defesa. Ao
passo que de forma completamente distinta, a tentativa de se identificar presença
de substâncias no organismo do agente com base apenas nas suas características
pessoais, até por depender exclusivamente da análise subjetiva da autoridade no
local, não se pode, em hipótese nenhuma, ser equiparada em nível de eficácia e
certeza com os resultados de um bafômetro ou exame clínico.
É importante a distinção entra
a prova pericial vista no inciso I do artigo 306 do CTB, que por possuir critério objetivo traz no seu resultado grande
possibilidade de certeza, diferente daquela obtida pela mera compreensão do
agente público para aquilo que poderia ou não indicar uma alteração da
capacidade psicomotora. Esta, que conforme já dito não possui o condão de
indicar a presença de álcool, na verdade ela se presta apenas como um
indicativo de que o condutor não estava em condições normais.
Daí surge outra pergunta: o que
seria condição normal? Pois muitas pessoas mesmo sob o efeito do álcool, ou
justamente por tê-lo feito a ingestão, acabam dirigindo com muito mais cuidado
e zelo do que se não tivessem feito uso de tal substância, enquanto que outras,
mesmo sóbrias já fazem barbáries nas vias. E ai, nesse caso o que seria normal?
Doravante, visando atribuir
maior grau de credibilidade nas constatações, observa-se no artigo 5º, §1º da
Resolução 432 do CONTRAM, a necessidade de haver um conjunto formado por várias
características:
§ 1º Para confirmação da alteração da capacidade
psicomotora pelo agente da Autoridade de Trânsito, deverá ser considerado não
somente um sinal, mas um conjunto de sinais que comprovem a situação do
condutor.
Diante dessa situação, questionamento
que surge como natural, é se haverá na prática pessoal capacitado tecnicamente
ao ponto de saber distinguir os sinais e até mesmo identificar se eles são
provenientes do uso de álcool ou outras substâncias, como por exemplo, uso de
entorpecente. Como poderá neste caso a autoridade afirmar, apenas com base naquilo
que se vê, qual o tipo de substância que teria sido feito uso?
Todavia, ainda que essa exigência
possa querer trazer maior segurança contra abusos e erros, o que se projeta para
a realidade futura é justamente o contrário, haja vista que exigir da
autoridade que espelhe em um simples relatório o máximo possível das
informações sobre o condutor, revela-se como
uma atribuição temerária e por deveras arriscada dada impossibilidade de se
auferir certeza daquilo que é lançado. Até porque, por ser a autoridade suscetível
à vários eventos que podem influenciar no seu “julgamento”, como garantir que
efetivamente ela possuirá o discernimento necessário para se fazer tais
constatações. Enfim, são questões levantadas no campo da abstração, mas que
devem ser consideradas na prática.
Até porque, não se pode esquecer
que toda essa perigosa facilidade de se imputar a prática de um crime a alguém,
crime este que não é de menor potencial ofensivo, além de elevar o numero de
processos, acarreta ainda em questões mais emergenciais como aumento no numero
de prisões. Apenas confirmando tal questão, vale dizer que desde que entrou em vigor, a nova lei já é responsável por um aumento de
125% do numero de prisões em flagrante por violação do artigo 306 do CTB, conforme dados divulgados pela Policia
Rodoviária Federal (http://blog.justica.gov.br/inicio/tag/lei-seca/).
Por mais que essa questão possa parecer desconexa ao assunto,
importante que se diga que não é, na verdade ela não deve ser deixada de lado em
nenhum tipo de debate dessa natureza, posto que é de conhecimento púbico e
notório que um dos maiores problemas da nação é o déficit de vagas no sistema
prisional, portanto, não se pode deixar de analisar as consequências das mudanças
do artigo 306 do CTB também por esse prisma. Por essa razão, deve-se asseverar
a necessidade de se criteriorizar e tratar com o máximo de retidão possível toda
essa questão envolvendo a análise subjetiva feita sobre as características do
condutor.
Concluindo,
o que já se toma como certo, infelizmente, é que muitos serão os processos
criminais iniciados apenas com base na verificação preliminar realizada pelo
agente público. De modo que essa nova situação exigirá do julgador uma
racionalidade muito maior para, analisando a totalidade do corpo de “provas”, poder
identificar aquilo que verdadeiramente ocorria no momento da autuação, ou seja,
se aquilo que foi apontado no relatório, muito provavelmente com um “X”, se realmente
indicava a elementar do crime.
Os resultados dessa análise
subjetiva feita pelo agente público, deverão receber do processo penal a mesma
importância e ou tratamento que teria qualquer outro elemento informativo
colhido na fase inquisitiva. Veja, que nesse caso ainda nem se fala em
inquérito, mas já se esta produzindo “prova”. Até por isso, que tal resultado
deverá ser medido por baixo, ou seja, por possuir um contraditório diferido
(futuro), e por não haver nenhuma forma de controle sobre o que foi posto no
relatório, deve ser tratado apenas como mais um elemento informativo que será
incluído no processo a criminal.
Por fim, é possível concluir
ainda, que para atender aquilo que a lei buscava atingir na prática, bastava o
legislador ter alterado a redação do artigo 306 do CTB, suprimindo dele qualquer menção a limite e ou indicador de
alcoolemia, fazendo dela efetivamente uma lei “SECA”, intolerante a abusos e ou
irresponsabilidades.
Confira
a resolução na íntegra: www.denatran.gov.br/download/Resolucoes/(resolu%C3%A7%C3%A3o%20432.2013c).pdf
REFERÊNCIAS
ARAUJO JR, Marco Antônio (coordenador da obra). Leis Penais Especiais.
Volume 18, Editora Revistas dos Tribunais (coleção elementos do direito, São
Paulo – 2013
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GOMES, Luiz Flávio. Criminologia midiática e os exageros da nova lei
seca, disponível em: http://atualidadesdodireito.com.br/iab/artigos-do-prof-lfg/19681/
Imagem 1 – disponível em: https://encrypted-tbn3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcT0csIecVxA5pfEv2MSXdTZEWghbFjRr8U-HtrBMd9GfLYJu44Y
NUCCI, Guilherme de Souza. Lei Penais e Processuais Penais
Comentadas; 4ªed., Editora Revistas dos Tribunais, São Paulo – 2009;
Resolução Nº432 do CONTRAN disponível em: www.denatran.gov.br/download/Resolucoes/(resolu%C3%A7%C3%A3o%20432.2013c).pdf